O que pode ser melhor do que experimentar uma das grandes lendas da história do rali? Talvez pilotá-lo o dia inteiro. Talvez num autódromo de verdade, na pista particular mais sensacional que esse país já viu. Talvez fazer tudo isso tendo ao lado dois pilotos profissionais para nos orientar a realmente aproveitar ao máximo uma das maiores concentrações de engenharia de alta performance já vistas num automóvel.
A oportunidade surgiu graças à participação em um evento do tipo drive training (semelhante à que já fizemos pela BMW/Pirelli) chamado Lancer Experience. Vamos falar mais sobre as atividades de pista no próximo post. Por enquanto, nos concentremos na máquina – que por sinal é explicada em minúcias logo na apresentação do curso.
Trata-se do carro quatro vezes campeão do WRC e dez vezes vencedor no PWRC, o Mundial de Rali para carros de produção, nos quais os Evo X correm com alterações que se resumem ao alívio de peso, equipamentos de segurança e buchas de suspensão mais resistentes. E só.
O interior bonito mas sem destaque poderia se passar pelo de um “esportivado” não fossem pequenos detalhes funcionais – o conta-giros com faixa vermelha entre 7 mil e 9 mil rpm, o velocímetro até os 300 km/h, as teclas dos modos da tração integral, do controle de tração e da transmissão Twin Clutch e, claro, nossos queridos bancos Recaro.
A expectativa pela primeira pisada é tanta que, quando ocorre, gera instantes – dois segundos, talvez menos – de ligeira decepção. A aceleração inicial é quase discreta, nada muito impressionante. Quando a rotação atinge os 3.000 rpm porém, alguma coisa acontece em seu coração. O ponteiro do conta-giros dispara de maneira alucinante, as costas grudam nos bancos e o carro é empurrado de forma tão demoníaca que parece possuído.
O saravá é causado por duas coisas: a turbina que entra em ação, e a configuração mais brava do comando variável MIVEC, que faz os quatro cilindros “quadrados” (diâmetro e curso dos pistões iguais) e 16 válvulas do motor 2.0 atingirem o pico dos 37,3 kgfm a 3.500 rpm. São 6,3 segundos para chegar aos 100 km/h, e depois tudo parece ficar ainda mais rápido até que, no auge dos 6.500 rpm, os 295 cavalos de potência voam a 240 km/h.
Os números impõem respeito, mas podem ser igualados por centenas de outros carros. O que realmente diferencia o Lancer Evo é o que ocorre quando você abre para a tangência, pisa no freio e entra na curva. Ele faz isso com facilidade quase sobrenatural. Os freios Brembo integram discos de 350 mm na frente e 330 mm atrás, com pinças de quatro e dois pistões respectivamente. A assistência vem de um sistema ABS esportivo com EBD, capaz de distribuir a carga de frenagem entre as rodas de lados diferentes.
Um rápido movimento no volante, e a relação bastante direta interage de imediato. São apenas 2,27 voltas de batente a batente. A carroceria não torce nada, e o trabalho dos amortecedores Bilstein e molas Eibach faz com que a transferência de peso seja rápida e mínima. Capô, teto, para-choques e todo o motor são de alumínio, e na versão MR – a que vem para o Brasil por 216 mil reais na tabela – as rodas de alumínio forjado BBS e os rotores de freio divididos em duas peças reduzem em quase três quilos o peso de massa não-suspensa de cada um dos quatro conjuntos, todos eles vestindo pneus Yokohama ADVAN 245/40 R18 de alta performance.
Na retomada, para fazer o motor girar com gosto acima dos 6.500 rpm, é preciso selecionar a opção S-Sport no seletor do Twin Clutch, logo abaixo da alavanca de câmbio. As trocas da transmissão robotizada com dupla embreagem são muito rápidas, intercalando as marchas pré-engatadas, e quando a próxima curva se aproxima, cada uma das reduções no paddle shift da esquerda são acompanhadas de um punta taco automático que volta a jogar o ponteiro do conta-giros lá em cima, com o rugido correspondente.
Guilherme Spinelli (tetracampeão do Rally dos Sertões e do Brasileiro de Cross Country) e Eric Darwich (supervisor de vendas dos Lancer Evo e Sportback e praticante de track days e provas de arrancada e regularidade) juram que, em uma série de voltas rápidas em Interlagos, o modo automático do S-Sport baixa em 1,5 segundo o tempo do modo manual, por melhor que seja o piloto. Pode ser, mas escolher você mesmo a marcha não tem preço.
Os paddle shifts são fixos, não acompanham os movimentos do volante. Nas condições para as quais o Evo foi concebido, não se trata exatamente de um defeito, pois se você tiver que reduzir dentro da curva certamente é porque já entrou errado e deixou de preencher os requisitos para extrair o máximo do carro.
A eficiência da tração integral S-AWD vem de uma saborosa sopa de letrinhas. O ACD (Active Center Differencial) distribui o torque entre os eixos dianteiro e traseiro. O AYC (Active Yaw Control) faz o mesmo tipo de serviço entre os lados do eixo traseiro, e a integração com os acelerômetros de medição longitudinal e transversal do ASC (Active Stability Control), sensores no volante e sensores do ABS permite que, no limite da aderência na traseira, o freio da roda dianteira do lado de dentro da curva seja acionado para endireitar a trajetória e despejar toda a força no asfalto o mais rápido possível, da melhor forma possível.
Com tudo funcionando, fica até difícil errar uma curva. Tanta tecnologia permite que qualquer um com mínima noção de tangência ande relativamente rápido. Por outro lado, isso incentiva a busca pelo limite, e ao contrário do que pode parecer, ele não é nem um pouco fácil de se atingir, pois está muito além do normal. Nessas horas você percebe que, num carro como o Evo X, o automóvel não é mais o limite principal, e sim o condutor. Se na maioria dos carros o aviso de que está saindo de frente ou de trás é o sinal para maneirar, num veículo de tração integral tão bem acertado é preciso estar preparado para experimentar novas possibilidades, pois a toda hora o Lancer parece dizer “eu posso mais, basta você ter a moral e decidir o que quer”. Como diz um amigo meu, é quando se separam os meninos dos homens.
Fonte: Jalopnik
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